As "cidades do futuro" pretendem ser verdes, sustentáveis, inteligentes e low cost. Isto já existe. Chama-se "Campo". Frederico Lucas

Wednesday, June 11, 2008

As Geografias do dinheiro

Às perguntas, Álvaro Domingues responde, por vezes, com mais questões. É assim que este professor da Faculdade de Arquitectura do Porto consegue exprimir um olhar crítico sobre diferentes temas, desde a geografia, à economia, criação de empresas e geração de riqueza.

Para este geógrafo portuense não há cidades competitivas ou criativas. O que existe são zonas em que se concentraram grupos sociais ou actividades económicas com aquelas características. E nada garante que se tenha sucesso quando se quer replicar, num certo sítio, a fórmula que gerou inovação e riqueza noutro lado.

Os factores que determinam o êxito económico são fluidos. Em particular num “país arquipélago” como é Portugal. “Uma parte do país está abaixo de água, abaixo dos indicadores económicos médios. Depois há afloramentos. Esses afloramentos podem ser pequenas ilhas, como Bragança, ou arquipélagos constituídos por ilhas muito grandes coladas a ilhas muito pequenas.” Quais são as consequências dessa organização do território? A eventual dualização da economia. E a concentração de problemas sociais nas grandes urbes.

Há uma expressão que cada vez mais se houve nos meios de comunicação
social: cidades competitivas. É possível juntar estas duas palavras?
É um adjectivo que não se aplica. Adjectivamos à frente das palavras “cidade” ou “urbano” coisas que dizem respeito à sociedade. Competitivo, para mim, diz respeito à economia e às empresas. Assim como outros qualificativos são sociológicos, culturais ou quase comportamentais como, por exemplo, cidade criativa.
A criatividade é suposto ser uma qualidade individual ou de um grupo. Estamos constantemente a confundir a ideia de cidade, enquanto conjunto construído, com a sociedade que ocupa esse conjunto construído. Temos a ideia da história – da Europa, sobretudo – de que as cidades eram compactos de construção
e sociedade ao mesmo tempo; que a cidade era a urbe, civitas e polis. Actualmente acho que as cidades
são cada vez mais fluidas.

Se cartografássemos os mecanismos da economia ou os da inovação, podíamos chegar a cartografias muito distintas. Podemos falar daquele projecto que, durante 24 horas, cartografou a intensidade das relações por internet a partir de Nova Iorque ou tendo Nova Iorque como destino. O que apareceu foi o mapa do mundo que, ao longo das 24 horas, ia mudando consoante a abertura das Bolsas de valores. A economia globalizou-se, a sociedade globalizou-se e muitas das transacções sociais e económico-financeiras têm cartografias que não cabem no mesmo mapa.

Falar em cidade competitiva é uma afirmação enfática para dizer que na cidade X (reconhecida como
sendo o território do município do Porto, Lisboa, Nova Iorque, etc.) há uma determinada organização,
um conjunto de pessoas e instituições que se ocupam de uma actividade económica que tem essa competitividade. E nesse aspecto é competitiva.

Algures na Índia, uma metrópole onde está a indústria do cinema ou a nova indústria da informação
é competitiva? Eu diria que as empresas e os seus profissionais de topo são competitivos. A sociedade indiana infelizmente é pobre. São estes os paradoxos. […]

in Revista Exame

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