As "cidades do futuro" pretendem ser verdes, sustentáveis, inteligentes e low cost. Isto já existe. Chama-se "Campo". Frederico Lucas

Wednesday, April 30, 2008

Cafés de SP viram escritórios online


Crescem opções para trabalhar fora do ambiente tradicional

O escritório do designer gráfico Daniel Arantes é o mundo. Aos 23 anos, recém-formado e ainda morando com os pais em um apartamento no bairro do Morumbi, na zona sul de São Paulo, ele trabalha com amigos em uma cafeteria dessas com acesso sem fio à internet. Faz trabalhos para uma revista produzida em Barcelona, tem um site colaborativo com outros designers ingleses e americanos, teve dois desenhos publicados num livro japonês e já foi convidado até para trabalhar em Lisboa e Paris. "Aprendi um pouco de espanhol só pelos e-mails trocados com os profissionais da Espanha", conta ele. "Quando fui convidado para trabalhar na França, eu nem consegui entender o e-mail e achei que era propaganda. O bom disso tudo é que tenho a liberdade de trabalhar do jeito que quero e ter a rotina que me dá vontade."

Talvez os vocábulos "trabalho" e "rotina" logo necessitem de uma definição um pouquinho diferente nos Aurélios. Ao juntar essas duas palavras numa mesma frase, logo se pensa em baias apertadas, chefes, horários, reuniões, relatórios de produtividade, departamento de recursos humanos, máquinas de café solúvel e todos os outros rituais e discursos da vida corporativa. Mas algo já está mudando nessas percepções, numa velocidade superior ao que muita gente está conseguindo perceber ou mesmo acompanhar. Diversos escritórios da cidade já relaxaram seus expedientes, principalmente as empresas "pontocom", sempre tentando transformar seus ambientes em lugares mais criativos. Na Predicta, por exemplo, uma empresa de tecnologia na Vila Olímpia, zona sul, os funcionários podem jogar videogame na televisão de plasma no meio do expediente e pegar uma cerveja na máquina de refrigerantes.

A tecnologia também está fazendo muitas pessoas virarem os próprios chefes e trabalharem por conta, sem perder com isso a troca de idéias e de experiências típica dos escritórios. Em cafeterias como Starbucks, Suplicy e Fran?s Café, é cada vez mais comum ver grupos trabalhando em seus laptops enquanto tomam um cappuccino. "Tem gente que cansou de ficar em casa trabalhando sozinho, enfurnado, e agora faz amigos em cafés e tem a chance de trocar conhecimento com outros profissionais iguais a ele", diz Henrique Bussacos, administrador de empresas que se cansou do ambiente corporativo e agora mantém um site com a ajuda de free lancers que se encontram semanalmente no café da Livraria da Vila, na Vila Madalena. "Vira quase um escritório casual."

EXPERIÊNCIA INOVADORA

No começo de 2008, São Paulo terá uma das experiências mais inovadoras no quesito "novas formas de trabalhar". A exemplo de Londres e Berlim, a cidade ganhará um Hub SP, uma espécie de escritório comunitário com internet sem fio, onde qualquer um pode levar seu computador e trabalhar lá. O local já está em construção, no número 409 da Rua Bela Cintra. Conforme palavras de seus idealizadores, o Hub será um espaço para conectar pessoas, alavancar projetos inovadores e inspirar transformações.

"Poucas vezes uma idéia genial surge na frente do computador, dentro de uma corporação", diz Pablo Handl, principal organizador do Hub. Para trabalhar lá, seja qual for seu projeto, será preciso pagar uma espécie de "taxa de estacionamento" - no início, mesmo que seja para ficar o dia inteiro, esse valor não deve passar dos R$ 400 mensais. "Queremos ter um espaço onde essas idéias apareçam naturalmente, onde as pessoas conversem, troquem informações. É o escritório do futuro para incubar as organizações do futuro."

in Estadao.Com.Br, Rodrigo Brancatelli

Saturday, April 26, 2008

Como é que vive um engenheiro do ambiente?

Lâmpadas, só das fluorescentes, e um ecoponto na marquise. São os primeiros sinais de que nos encontrámos em terreno protegido. A casa de Pedro Santos, director-delegado da agência “EDV Energia” e presidente da Associação Portuguesa de Engenharia do Ambiente (APEA), podia ser a de qualquer um. O engenheiro vive desde Setembro do ano passado num apartamento pequeno de um prédio antigo. “É emprestada”, diz, até concluir a casa que está a construir no bairro do Espadanal. Essa sim, “a verdadeira casa ecológica”. Mas voltemos ao apartamento pequeno.

“Hoje ter comportamentos ambientais significa poupar muito dinheiro”, afirma o engenheiro. As facturas de electricidade demonstram-no. Por cada dois meses, a família Santos, composta por dois adultos e duas crianças, gasta apenas 44 euros. A fórmula está em pequenos pormenores.

Na cozinha, os electrodomésticos são todos de classe A, ou seja, mais eficientes em termos energéticos. “São mais caros mas a diferença não é assim tão grande quanto isso”, justifica. A louça só se lava na máquina e a roupa só quando o tambor está a abarrotar. Ambos os equipamentos só funcionam à noite, durante um período de horas em que a electricidade é mais barata. É o chamado tarifário bihorário.

Passemos ao escritório. Os cartuchos da impressora são recarregáveis, assim como as pilhas. Os primeiros servem perfeitamente para uso corrente e custam menos de metade do preço dos originais. Quanto às pilhas, Pedro Santos já não se lembra da última vez que teve que comprar um pack. “É um investimento que claramente compensa”, assegura, com o carregador na mão.

O papel, como não poderia deixar de ser, também é reciclado. “E hoje até já não se distingue do papel normal, porque também é branco”. “É mais caro”, reconhece o engenheiro, “mas não muito e, de futuro, cada vez menos. A produção não o justifica e a tendência é que estes produtos sejam mais baratos, com o surgimento de taxas diferenciadoras positivas”.

O único equipamento electrónico em modo stand by na casa é a caixa da televisão por cabo. “Porque é um aparelho mais frágil, temos evitado o ligar e desligar”, justifica Pedro Santos. Todos os outros estão desligados.

Um dia por semana a trabalhar a partir de casa

Para o engenheiro, o aquecimento e as deslocações para o trabalho são actualmente os únicos impedimentos a um comportamento totalmente sustentável.

Em relação ao primeiro, a intervenção para uma melhor distribuição do calor deveria ser feita na própria construção da casa. Para quem tiver uma lareira, Pedro Santos recomenda a instalação de um recuperador de calor. “Com menos lenha aquecemos muito mais a casa e é um investimento que voltou a ter benefícios fiscais”, explica.

As deslocações para o local de trabalho, em Oliveira de Azeméis, são mais difíceis de fazer sem prejudicar o ambiente. Por isso, a mobilidade e os transportes são das temáticas que mais têm ocupado os técnicos da agência de energia. “Se na Linha do Vale do Vouga houvesse mais frequência de comboios, - já nem falo na qualidade - as pessoas utilizavam-na”, assegura Pedro Santos.

Ainda assim, a EDV Energia encontrou uma forma de dar o exemplo, ao ceder aos seus funcionários um dia por semana para trabalhar a partir de casa. “Poupa-se no combustível, protege-se o ambiente e promove-se o teletrabalho”, afirma o director. “Como a nossa gestão é por objectivos, o importante é que o trabalho apareça feito e bem feito”, justifica.

Casa “verdadeiramente ecológica”

Na sua nova casa, no Bairro do Espadanal, Pedro Santos pretende aplicar tudo aquilo que apregoa.

A residência aproveitará ao máximo a luz natural, assumindo um posição favorável ao sol, e será sustentada pelos melhores materiais do ponto de vista ambiental. A arquitecta escolhida pela família Santos, especializada em arquitectura bioclimática, assegurará esses dois pontos.

Para além disso, serão instalados equipamentos que reencaminham as águas pluviais para usos posteriores, nomeadamente no autoclismo e no sistema de rega. Uma caldeira de biomassa alimentará o sistema de aquecimento central e um painel solar térmico aquecerá a água.

A família está a ponderar ainda a aquisição de um painel solar fotovoltaico, que não só abasteceria a casa de energia, mas poderia também ser rentabilizado, através da venda à rede. “É algo que ainda não decidimos, porque é um equipamento que custa entre 20 e 25 mil euros”.

Será também no Espadanal, que Pedro Santos pretende recorrer à compostagem doméstica para se livrar dos restos de comida. Com um custo que não ultrapassa os 30 euros, o compustor faz a reciclagem dos dejectos, convertendo-os em adube natural que pode ser utilizado no jardim. “Os nossos avós já o faziam, mas para um buraco no jardim”, recorda.

in Jornal Labor, Anabela S. Carvalho

Wednesday, April 23, 2008

Novas Fronteiras



Quinze por cento da população europeia deita-se todos os dias sem perspectivas de uma vida digna no dia seguinte.

João Wengorovius Meneses

Mais de 70 milhões de cidadãos da União Europeia (UE) vivem em situação de pobreza ou exclusão. Ou seja, 15% da população europeia deita-se todos os dias sem perspectivas de uma vida digna no dia seguinte.
Esta é a Europa que celebra esta semana cinquenta anos de vida. Conseguiu paz e crescimento económico mas não foi capaz de assegurar a coesão social. Na celebração do seu aniversário, a Europa não pode esquecer que “combater a pobreza é uma obrigação moral numa sociedade que se quer respeitar a si própria”, deve voltar a responder “sim” à pergunta “é possível mudar a sociedade?”. Só há um destino possível para a Europa: reencontrar um sentido humanista para o desenvolvimento.
Em 2000, o Conselho Europeu de Lisboa definiu como objectivo estratégico para a UE “tornar-se na economia baseada no conhecimento, mais dinâmica e competitiva do mundo, capaz de garantir um crescimento económico sustentável com mais e melhores empregos e com maior coesão social”.
A inovação foi então definida como factor chave para o crescimento económico e para a coesão social foi agendada a reforma do Modelo Social Europeu. Mais do que de reformas, do que a coesão social depende é de inovação, de novas estratégias de resposta a novas e antigas formas de exclusão. Quais? É a pergunta a que urge responder.
Vejamos o caso de Portugal. Sabe-se que 20% da população portuguesa vive em situação de pobreza ou exclusão. Mas não se conhece nenhum levantamento das necessidades dos diversos grupos em risco e das respostas dadas por parte do sectores público, privado e do terceiro sector.
Só da parte das respostas dadas pelo Estado, estão em curso os seguintes planos que visam a inclusão ou a sustentabilidade social: Plano Nacional de Acção para a Inclusão (PNAI) 2006-2008, Plano Nacional de Emprego 2005-2008, Plano de Acção para a Integração das Pessoas com Deficiências ou Incapacidade 2006-2009, Programa de Alargamento da Rede de Equipamentos Sociais (PARES) 2006-2009, Plano para a Integração dos Imigrantes e o Plano de Implementação da Estratégia Nacional de Desenvolvimento Sustentável 2005-2015, aos quais se deverão acrescentar os diversos programas financiados directamente pelo Fundo Social Europeu e, em breve, os programas operacionais do Quadro de Referência Estratégica Nacional (QREN) 2007- 2013. Mas estes planos foram definidos com base em que diagnóstico de necessidades? E como se articulam com as respostas dadas pelo terceiro sector e pelas autarquias?
Um mapa nacional das necessidades e respostas sociais permitiria a articulação dos planos de acção de todos os actores envolvidos nas acção social.
O diagnóstico a ser levado a cabo pela Rede Social (cujos resultados se aguardam) é importante, mas não envolve todos os actores sociais e a Carta Social dá uma boa perspectiva dos equipamentos de resposta mas tem a limitação de que as respostas não se esgotam nos equipamentos.
Para além da ausência de diagnósticos também é raro avaliar o impacte das várias soluções de resposta possíveis. A este nível, foi publicado recentemente um interessante “Estudo de avaliação do sistema do microcrédito em Portugal”. O estudo assegura que também em Portugal o microcrédito é uma eficaz e competitiva ferramenta de combate à pobreza (embora ainda sem expressão).
Amanhã, Muhammad Yunus, pai do microcrédito e Prémio Nobel da Paz em 2006, estará na Gulbenkian para uma conferência. Como o próprio disse: “Quando se planta a melhor semente da árvore mais magnífica num vaso, obtém-se apenas uma réplica dessa árvore em miniatura. As pessoas pobres são como bonsais. Não há nada de errado com as suas sementes. Simplesmente, a sociedade nunca lhes deu espaço para crescerem. Tudo o que é necessário para as retirar da pobreza é criar um ambiente propício. No dia em que estas consigam usar plenamente toda a sua energia e potencial, a pobreza vai acabar muito depressa.”
Se, em 2010, a UE deseja celebrar o Ano Europeu contra a Pobreza e a Exclusão Social terá de tomar medidas hoje. Novas medidas, claro, para novas fronteiras sociais.


in Diário Económico, João Wengorovius Meneses, Gestor nas ONG Chapitô e TESE