As "cidades do futuro" pretendem ser verdes, sustentáveis, inteligentes e low cost. Isto já existe. Chama-se "Campo". Frederico Lucas
Tuesday, December 18, 2007
Reinserção: O rei do caroço de cereja
É assim que Zé Miguel é conhecido entre os presos de Sintra, que o ajudam a fazer as almofadas que está a vender com sucesso na Internet
Os filhos costumavam brincar debaixo do edredão com a almofada de caroços de cereja feita pela avó, no mais puro deleite. “Um dia ocorreu-me, ao olhar para eles, que se a almofada os divertia tanto e lhes dava um prazer tão genuíno é porque também devia ser algo de bom para outras pessoas”, refere José Miguel Amorim (ou Zé Miguel, como prefere ser chamado). Foi assim que nasceu o site www.ricoxete.com, dedicado à venda de almofadas de caroços de cereja, e uma oportunidade de vida para Zé Miguel, que estava há algum tempo desempregado.
Após “uns 50 telefonemas”, Zé Miguel conseguiu montar toda a operação. Registou uma patente e abasteceu-se de 10 toneladas de caroço de cereja, cuja limpeza está a cargo dos reclusos do Estabelecimento Prisional de Sintra, onde já é conhecido pelo ‘senhor do caroço’. Ele próprio escolheu os tecidos das almofadas e ‘adjudicou’ a sua execução às reclusas de Tires, tendo-lhes também oferecido duas máquinas de costura. “É uma experiência muito gratificante trabalhar com pessoas que estão presas”, refere Zé Miguel. “Dá para sentir que de alguma forma estou a colaborar para a reinserção social dessas pessoas”. E garante que uma parcela dos €26,5 do preço por almofada vai direitinho para estes reclusos.
Do que Zé Miguel não estava à espera era do sucesso imediato das almofadas de caroços de cereja - que, aquecidas um minuto no microondas, substituem os habituais sacos de água quente. O Spa Six Senses do hotel Penha Longa, em Sintra, apressou-se a fazer uma encomenda para fins de massagens. O telemóvel, divulgado no site, não tem parado de tocar com inúmeros pedidos. “Ligou-me um senhor a dizer que a filha com quinze dias de vida fica toda satisfeita com o calor da almofada. Eu até me calei. Só lhe dei os parabéns”.
Outra surpresa veio de conversas com médicos, fisioterapeutas e osteopatas, que lhe falaram de diversos efeitos benéficos desta almofada, em particular ao nível da termoterapia. Zé Miguel prefere classificar as tradicionais almofadas que reinventou para consumo moderno como um “produto inovador, honesto, biológico, biodegradável, hipoalergénico e totalmente feito em Portugal”.
Venda nos balcões CTT
Na execução das elegantes embalagens pretas nota-se o cunho do Zé Miguel, que já foi «designer» gráfico no jornal ‘Público’ e se assume como um “homem dos sete instrumentos» (também é formador de condução defensiva de motoristas que transportam matérias perigosas). Mariana, a filha de 8 anos, é que “resolveu o problema do marketing”. “Ia a passar quando vi que ela estava a fazer o trabalho de casa”. A redacção da Mariana, ‘O Jardim das Cerejeiras’, figura agora dentro das embalagens das almofadas num papel preto brilhante com letras brancas.
Os CTT já se mostraram interessados em vender as almofadas de caroços de cereja nos seus 1080 balcões em todo o país. “Será uma forma de chegar ao povo real, que não tem acesso à Internet”, faz notar. Se Zé Miguel arriscou tudo ao produzir 10 mil almofadas de uma assentada, também viu abrir-se uma caixa de Pandora com solicitações inesperadas. “Qualquer dia estou a vender na Rússia. Não sei onde isto irá parar”.
Expresso, Conceição Antunes
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